sexta-feira, 22 de março de 2013

Autoajuda?



Autoajuda é um fenômeno curioso. Primeiro surgiram os livros. Depois as palestras. Agora, com as redes sociais, a autoajuda tem seu momento mais que pop: as fotos e ilustrações com legendas. O mais engraçado é que as frases são atribuídas a notáveis como Shakespeare, Platão, Aristóteles, Clarice Lispector. Até os mais moderninhos como Tati Bernardi, Martha Medeiros e Fabrício Carpinejar já conseguiram suas ilustrações. E o pior é que é muito óbvio que o autor em questão jamais escreveria aquilo. Ou porque a frase é muito pobre, ou porque o vocabulário é moderno demais para isso. Gente, eu já vi atribuírem a filósofos gregos coisas que jamais poderiam existir na época. 

E o pior de tudo é que esse negócio de autoajuda não funciona. A pessoa lê, fica toda emocionada, acha que a coisa foi escrita exatamente para ela, e diz: é isso mesmo, eu vou tomar um rumo na minha vida agora! Então tem uma noite de sono e volta tudo a ser como era antes. E no dia seguinte, lê outra coisa, e assim ela segue, dia após dia.

Lembra-me muito as palestras motivacionais. Existem empresas que fazem essas palestras diariamente, pela manhã. O sujeito sai para trabalhar pilhado, depois da palestra. No fim do dia, está meio desanimado, mas no dia seguinte a palestra vai fazer com que ele continue o processo.

E por que não funciona? Porque são muletas. Porque são perfeitas. Porque são confortáveis. Porque acalentam. Porque são apenas mimos.

Veja só um dos pensamentos que mais fazem sucesso. São muitas as variantes, mas a idéia é mais ou menos essa: Deixe quem você ama ir, se for seu, volta. Ora, ora, todo mundo que está sofrendo de amor fica felicíssimo com uma frase dessas. Você está lá, contorcendo de dor, sofrendo e achando que seu mundo acabou e acreditando que nunca mais vai amar de novo. E aí vem uma frase bonitinha que diz que você não precisa sofrer, porque pode ser que a pessoa volte, ela só quer um tempo. E aí seu coração se enche de esperança, e você vai dormir feliz aguardando o tal dia chegar. 

Outro da mesma linha: Quem te ama te valoriza, te procura. O sujeito está lá, se sentindo abandonado pelo seu amor. Vem alguém e diz justamente o que ele quer escutar. Como ele fica? Feliz, porque se sente cheio de razão. E fica procurando e procurando aquele ser humano que vai valoriza-lo incondicionalmente.

Tudo mentira, minha gente. Quem foi, em tese não volta. Em algumas situações, pode até voltar, mas esta não é a regra. Se foi, é porque não ama mais e ponto. E quem te ama não te valoriza o tempo todo não. Quem te ama tem um monte de coisa pra fazer, e antes de mais nada precisa se valorizar. Quem te valoriza o tempo todo na realidade é um babão obcecado por você. E vamos combinar, quem te valoriza o tempo todo… enjoa! Querida Cinderela, amor só sobrevive em movimento. Amor redondinho é falso, desculpe. Quem só elogia não conhece ou não quer conhecer.

Tem uma porção de outras frases assim, que deixam as pessoas felizes. E por que elas ficam felizes? Porque elas sentem que têm razão. E ainda por cima têm algo que guia os seus passos, como receita para a felicidade. E por que não funciona? Porque nada que só te afaga o tempo todo funciona. O que afaga deixa você parado. O que afaga não faz você pensar no novo. O que afaga faz feliz apenas por algum tempo. Depois fica o vazio. O vazio de continuar no mesmo lugar. O vazio de não crescer.

O que funciona então? O que funciona é o que provoca, que enraivece, que contraria. Que incomoda, que irrita. Só assim somos forçados a enxergar por outros ângulos, só assim somos forçados a nos movimentar, a mudar, a crescer, a aprender. Só reage quem é provocado. A vida é movimento. E quem está no quentinho não se move. 

Pois é. Não adianta procurar alento para o coração. O que realmente funciona é o movimento. E só aquilo que incomoda movimenta. É o diferente que nos tira de nós mesmos. Autoajuda não funciona por isso. Porque é auto. E de nada adianta girar em torno de si mesmo. 

terça-feira, 12 de março de 2013

Armários vazios



Encerrar um amor não é fácil. Digo encerrar um amor, não uma paixão ou um encantamento. Paixão, encantamento, se vão, tão leves como chegaram. Chegam como uma chama, alegram nossas vidas e, como um sonho bom, uma brincadeira, se despedem, devagarzinho, de fininho.

Amor não. Amor não chega como fogo, embora às vezes se aproveite dele para entrar. Vai se instalando, sem a gente perceber. Nem tem como se proteger. Quando você percebe, está amando. E está mudando o rumo de sua vida, mudando seus caminhos. Sonhando, fazendo planos.

Por isso dói tanto quando um amor se vai. De repente, os sonhos desaparecem, os planos se destroem, de repente sua vida não tem mais um rumo. De repente, tudo aquilo que se sonhou, que se sorriu, que se construiu, que se perdeu, tudo isso, desaparece. E sobra você sozinho, procurando um outro caminho para seguir.

Só caminhamos juntos por amor. Só modificamos nossas vidas por amor. Só abrimos mão de parte do que somos por amor. Sem o amor, nada faz sentido. O amor é o único sentimento que, de tão poderoso, faz com que emprestemos parte de nossa vida a outra pessoa. Que nos faz perdoar o imperdoável, e ignorar o que seria intolerável. 

Mas o amor é também exigente, exige cuidados. Não admite frações. Ou ele tem tudo, ou não tem nada. Você pode até tentar o enganar o amor, dando-lhe frações do que ele precisa. Mas não adianta, ele não vai sobreviver. Aos poucos, ele morre. Aos poucos, mas não sem dor. Amor é o mais forte e ao mesmo tempo o mais delicado dos sentimentos. 

Dizer que o amor sobrevive a uma separação é enganar-se. Às vezes queremos enganar nossa dor e dizer que vamos nos amar para sempre, mesmo separados. Pura mentira. Separados, caminhamos por outros caminhos. Não temos mais  a quem emprestar nosso coração, nossa alma. Nem podemos mais fazer isso. Como emprestar nossa vida a alguém que não sabemos mais ao certo quem será, daqui por diante? Não adianta. Não há generosidade fora do amor.

Separar-se é isso. É cada um pegar seus pertences. É começar a separar o que é seu, e o que não é. É ver ir embora aquilo que você já achava que era seu. É sentir falta daquilo que nem combinava na sua casa, mas que você permitiu que entrasse, e no fim acabou gostando. É olhar para os armários vazios, e não saber o que colocar neles. Embora tenha dado um trabalho danado para arranjar um espaço nestes mesmos armários. 

Os armários resumem tudo. Não, não havia espaço naqueles armários. Mas você abriu um espaço neles. Deixou o outro entrar. E agora, eles estão vazios.  E está na hora de preencher os  seus armários com o que você tem. Só que agora do seu jeito.