quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Valsinha

         
Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito
de sempre chegar
olhou-a de um jeito muito mais quente
do que sempre costumava olhar

        Estava voltando para casa numa madrugada, quando a minha amiga Priscila viu um casal dançando no ponto de ônibus. Achou bonitinho. Já que tinham que esperar o ônibus, resolveram se divertir.

            Imediatamente me veio à cabeça a canção "Valsinha", do Chico Buarque. Chico sempre me emociona, em diferentes momentos da vida e por diversas razões. Pode não ser um grande cantor, mas interpreta com tanto sentimento seus versos que esquecemos que ele não é lá muito afinado. E com aqueles tímidos olhos verdes, para que ser afinado, oras bolas.

            Valsinha conta a história de um casal já desgastado pelo cotidiano e suas dificuldades. Um dia, o marido resolve chegar diferente. Olha para sua esposa com olhos de homem, e não de marido. Esse simples olhar faz com que ela se sinta mulher de novo, desejada. E a convida para passear, sem falar das suas agruras diárias.  A canção vai crescendo, e junto com ela a mulher, que resolve se fazer bonita para o seu homem, já que finalmente vai ser olhada. Renasce. E saem para passear, começam a dançar, trocam carinhos apaixonados, e ficam mais bonitos, e enxergam tudo mais bonito, e tornam tudo ao seu redor mais bonito.

            A canção termina e você se sente feliz. Começa a achar tudo ao seu redor mais bonito também. E tem vontade de dizer palavras lindas para quem você ama. Ou, se não ama ninguém, acaba ficando com vontade de amar.

            Amor torna tudo mais bonito. Tantas vezes ficamos afogados em nossos próprios problemas, sem achar solução, nos sentindo infelizes, quando na realidade basta olhar para quem está ao nosso lado. E que também está se sentindo afogado em seus próprios problemas e se sentindo sozinho, tanto como nós mesmos. Uma palavra bonita, um gesto de carinho e de doação, esquecer um pouco de si próprio e provocar um sorriso no outro têm um efeito muito mais que terapêutico. Uma alegria provocada em alguém expulsa a sua própria tristeza. E sua alegria vai contagiando todos ao seu redor. E a única coisa que você fez foi sair do seu mundinho e olhar para o outro ao seu lado.

            Funciona com amigos, com o trabalho e principalmente no amor. Sair de si próprio, olhar e desejar. Olhar e sentir as necessidades. Olhar e escutar. Olhar e falar. Olhar e tolerar, entender. Olhar, olhar sempre. Olhar e se permitir ser olhado. Não existe amor entre pessoas que não se olham.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

É só amor, nada demais...

           Se tem uma coisa que a gente não escolhe na vida, é quem a gente ama. Podemos escolher nossa profissão, onde vamos morar, nossos amigos, o estado de alegria ou de tristeza, mas não quem a gente ama. Podemos até escolher quem a gente quer ao nosso lado, compartilhando nossa vida, e podemos até dizer que isso é amor, e chegar mesmo a acreditar nisso. Podemos até agir como quem ama, mas ainda assim vai ser muito diferente daquilo que se sente por quem a gente realmente ama.

            A gente pode amar a pessoa mais errada do mundo, e sabe disso. Mas a gente continua amando. A gente sabe de todos aqueles defeitos, de todas aquelas fraquezas, sabe e enxerga, mentira quem diz que o amor é cego. O amor não é cego não, ele vê tudo. É que o amor não julga, ele simplesmente ama tudo o que vê. É aquele jeitinho diferente de sorrir, um dentinho meio torto, um jeito destrambelhado de andar, aquele tique nervoso, aquela impetuosidade que a todos aborrece, tudo isso que é irritante aos olhos dos outros parece lindo aos olhos de quem ama. E a gente defende o ser amado com todas as nossas forças, mesmo percebendo o quanto ele erra.

            Os moderninhos de plantão adoram estabelecer regras ao amor. Dizem que ele só funciona se você não perder sua individualidade. Dizem para respeitar a liberdade. São tantas regras, é tanto respeito que parece até difícil amar. E se eu sentir saudade e quiser ligar? E se eu estiver carente e precisar de um abraço? E se eu me sentir insegura e quiser chorar? E se eu não gostei do jeito que você me tratou? Não, não pode. Tem que respeitar, tem que agüentar tudo sozinha. Porque é tudo problema meu, e não da outra pessoa. Não se pode importunar o outro com as nossas necessidades, porque afinal de conta ele tem as dele e você não pode ultrapassar limites.

            Só que amar é invadir e querer ser invadido. É querer que a pessoa saiba de todos os detalhes da sua vida. É querer dividir. Na verdade, nem é dividir. Não existe o meu e o seu quando se ama. Não se imagina provar algo sozinho, não se imagina que aquele sabor especial não possa ser sentido também por quem se ama. Tudo o que se experimenta, tudo o que se sente, cada alegria, não se consegue imaginar que o outro não sinta também.

            Parece absurdo? Pois é sim. Ou melhor, é amor. Amar muda a gente. Quem ama faz coisas que  jamais imaginaria fazer por alguém. Aquele ser tão egoísta, de repente passa a cuidar e acarinhar. A pessoa avessa a carinho, passa a passear de mãos dadas e querer ficar abraçadinha. O não romântico passa a dizer palavras bonitas e enviar flores. Quem ama esquece toda a carcaça que construiu para si próprio, perde todas as defesas. Parece insano, não? Mas não é não.

            O problema é que, quem vai despertar tudo isso na gente, não é questão de escolha. Mas é questão de escolha querer viver isso tudo. Sério, você não precisa viver esse tipo de coisa. Não vai ser mais ou menos feliz por causa disso. Nem melhor ou pior que alguém. Afinal de contas, é só amor. Não é nada demais.