quinta-feira, 19 de maio de 2011

A garota da capa vermelha


        Fui assistir ao filme "A garota da capa vermelha" decididamente contrariada. A sinopse dizia assim: versão Crepuscular da história de Chapeuzinho Vermelho. Nossa! Mais uma dessas baboseiras adolescentes em que a linda mocinha desprotegida, meiga, frágil, e completamente desinteressante é disputada por dois belos exemplares masculinos musculosos e intrépidos dispostos a tudo para conquistá-la e satisfazê-la. Essa idéia me incomoda muito, porque desperta nas garotas um sonho venenoso: o de ser protegida e amparada por um homem forte, que a defende de tudo e de todos. O que é apenas uma ilusão. Um homem que age dessa maneira apenas atende à própria vaidade. Ele não está preocupado com a mocinha, que pode ser qualquer uma, desde que desprotegida o suficiente. Ele está apenas preocupado em afirmar sua masculinidade perante os outros machos.  Um homem de verdade quer uma parceira que se defende sozinha e brilha ao seu lado, e não um bibelô. Um homem de verdade respeita e admira sua mulher. E respeito é tudo o que uma mulher de verdade espera de um homem. E admiração mútua é o combustível de um relacionamento de verdade.

        Enfim, meu feminismo à parte, diante da rinite atacada, da dor de estômago, do mau humor e do tédio que me assolavam, lá fui eu, pior não podia ficar. Fotografia medieval interessante, roteiro totalmente previsível. Duas crianças cheias de afinidade que crescem juntas e inevitavelmente se apaixonam, e está na cara que no final do filme vão ficar juntas. Mas não é que a mocinha me surpreende?

        Sim, ela é linda. Perfeita, ágil, inteligente. Parece que realmente foi dotada de todas as qualidades que uma mulher almeja. Faz parte de um conto de fadas. Mas o que me surpreende nela são pequenos detalhes que a distinguem das demais mocinhas. "Eu sempre tentei ser uma boa menina, mas...", diz ela em sua fala inicial. Ainda criança, ela se dispõe a matar um coelho com as próprias mãos, sob os olhos assustados do companheiro. Mata não por maldade, mas porque tem que ser feito e pronto. Essa sua característica é marcante. O que tem que ser feito será feito. Sem dramas, sem lágrimas, sem autopiedade. Acusada de bruxa, não hesita, admite tudo o que fez, aceita a pena porque tem que ser aceita.

        Sua determinação. Seu amor de criança é Peter, o lenhador pobre e tosco. Em nenhum momento ela hesita, a despeito do bom caratismo, da doçura e do amor de seu prometido, Henry. Não há dúvida, mesmo diante do mais fácil e confortável. Novamente, não há pena ou comiseração. Ela escolheu o seu caminho, pois reconhece em Peter qualidades que só a ela importam, e vai percorrê-lo.  E pronto. Não importa o que pensem ou digam.

        A autoestima é surpreendente. Provocada por Peter, que arruma outra garota para despertar seus ciúmes, ela revida, mas não caindo nos braços de outro homem. Sim, ela não precisa mostrar que é interessante só porque consegue despertar o interesse de outros homens. Tira uma amiga para dançar e o provoca, ela mesma, com toda a sua graça e sensualidade. Ela sabe que é interessante por si só, sem precisar de homem algum do seu lado. Quem precisa da procura para ser valorizada no mercado são as ações da Bolsa de Valores, não mulheres de verdade.

        Enfim, não vá ao cinema buscando uma verdadeira obra-prima. Mas é muito bacana o roteiro adolescente incutir de forma tão sutil valores tão saudáveis às meninas. Creio que Valérie nunca será tão popular como a chatinha e insossa Bella, de Crepúsculo. Bella está mais próxima do inconsciente frágil e acomodado que injetaram em cada uma de nós. Mas é uma sementinha. E afinal, ela conseguiu tirar meu mau humor e me fez sentir que sim, vale a pena ser forte. As coisas também funcionam para as não princesas, embora seu final não seja cor-de-rosa como o delas...

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