sábado, 14 de maio de 2011

I'm not Cathy


      Meu livro favorito, desde adolescente, é o Morro dos Ventos Uivantes. E Cathy, selvagem, inteligente, impetuosa, passional, destruidora, minha heroína através dos tempos. A paixão arrebatadora de Cathy e Heathcliff, que resiste a tudo, ao tempo, aos casamentos de ambos, aos filhos, à distância, sempre povoaram o meu imaginário tão aventureiro. Lindo demais um amor que resiste a tudo e a todos.

          Mas pensando bem, será que esse amor resiste a tudo porque é forte?

        Não, ele só resiste porque nunca se concretiza. Não é forte, é tão frágil que não tem coragem de acontecer, não tem coragem de enfrentar uma dura realidade que um amor de verdade exige. O amor romântico só é tão lindo porque é mantido sempre na linha da dúvida, o que exige demonstrações calorosas e jogos de sedução o tempo todo. O que realmente é lindo e delicioso no início, mas com o tempo transforma-se em mera obsessão. Deixa de ser saudável para tornar-se uma doença. Essa obsessão é destrutiva, e penso que é a causa de violências cometidas em nome do amor.

        Amor forte é o amor de verdade. Aquele que, passados os joguinhos da conquista, finalmente se concretiza. Transforma-se na certeza de ter finalmente encontrado aquele alguém especial. Alguém tão imperfeito como nós mesmos, e que nos complementa, nos torna melhores. O que significa caminhar juntos, traçar planos e projetos, olhar na mesma direção, lado a lado. Sem jogos de dominação, sem competição, sem vaidades. Conhecer e tolerar as diferenças, ter cumplicidade.  Ter consciência de que momentos de monotonia existirão, mas que vale a pena resistir e fazer valer a união. Sim, o amor forte é aquele que luta e impede o seu próprio fim, apesar do tempo, apesar das diferenças, apesar das crises, apesar do tédio. Um amor que resiste à convivência, porque o que se constrói a dois vale muito mais que qualquer outra breve emoção que se possa sentir.

        Cathy, minha heroína, na realidade era covarde. Nunca teve coragem de viver seu grande amor por Heathcliff. Não teve coragem de enfrentar os preconceitos, a pobreza. Preferiu viver sua vida burguesa, alimentando ao mesmo tempo a paixão de Heathcliff. Paixão obsessiva, que nunca conseguiu se concretizar, e destruiu não só a ambos, mas a todos ao seu redor. Cathy, no fundo, tinha medo de que esse amor talvez não fosse tão forte assim, a ponto de resistir à dura realidade. E preferiu deixá-lo dessa maneira, apenas no começo, com a intermitente ameaça de seu fim. Nunca terminaria, porque nunca começaria. Se encontrariam na morte, esta sim eterna e imutável.

        Continua sendo um lindo romance e uma linda história de paixão, que nos leva a emoções deliciosas de se sentir, com toda a habilidade de Emily Bronte, que tão jovem o escreveu. Uma linda história de paixão ( e não de amor), seguida pela obsessão, que a tudo destrói. Porque uma história de amor, de verdade, começa depois, quando o romance decreta "e foram felizes para sempre". Porque aí vão ser necessárias a força e a coragem para que a união sobreviva. E isso sim não é para qualquer amor.

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